08/09/20

Os desafios do mercado editorial em 2020

Depois de um crescimento em 2019, o setor editorial brasileiro se deparou com a pandemia de Covid-19 e com a ameaça de taxação dos livros (Foto: Getty Images/iStock)

O começo de 2020 foi de otimismo para o mercado de livros no Brasil. Em 2019, o setor teve um crescimento real de 6,1%, com um faturamento de 5,67 bilhões de reais. É o que diz a pesquisa Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro, realizada pela Nielsen Book e coordenada pela Câmara Brasileira do Livro e pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros.

O resultado é melhor do que os números de 2017 e de 2018. Além disso, janeiro de 2020 apresentou um resultado melhor comparado ao mesmo período no ano passado. Em março, o fechamento do comércio por conta da pandemia de Covid-19, afetou as livrarias físicas.

O que era otimismo no começo do ano, acabou dando lugar a incertezas sobre como o mercado editorial seria impactado com aquela nova realidade, conforme explica José Ângelo Xavier, presidente da Abrelivros - Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares.

"A pandemia afetou a todos. Afetou todas as pessoas, todos os negócios e afetou muito o comércio de maneira geral. E as livrarias físicas, no meio disso. Houve uma diminuição muito grande nas vendas. A indústria sentiu bastante o fechamento do comércio. Novas oportunidades surgiram: vendas pela internet; algumas atividades de autores fazendo bate-papo, contando história, fazendo palestra para o público em geral. Comparando os números, isso não compensou a queda geral das vendas, porque o comércio físico, no caso do livro, as livrarias, tem um papel muito importante, especialmente naquela venda de impulso. Aquelas pessoas que estão passeando por um shopping ou uma livraria e, ao se deparar com um determinado livro, acaba comprando para dar de presente. Então, o comércio físico, para o livro, é muito importante, e a gente sentiu muito, na pandemia, o impacto do comércio fechado".

A Livraria Lamarca, no Benfica, começou a vender livros pela Internet por conta da pandemia de Covid-19 (Foto: Alex Gomes)

A Livraria Lamarca, no Benfica, começou a vender livros pela Internet por conta da pandemia de Covid-19 (Foto: Alex Gomes)

Com os novos desafios, o pequeno comerciante também teve que se adaptar. Guarany Marques é proprietário da Livraria Lamarca, no bairro Benfica. Antes da pandemia, ele não contava com vendas online. Seu público era essencialmente presencial.

"A gente iniciou uma venda online, através do facebook e do instagram. Uma venda que é muito diferente da que a gente faz em loja. Na venda online que a gente faz, é muito mais uma consultoria do que uma venda em si. Então a gente vai tentar identificar o que o cliente quer, no que ele se interessa e vai apresentar as possibilidades dentro da livraria.  Nos dois primeiros meses, a gente teve uma queda no nosso faturamento muito significativa. Em maio, a gente passou 15 dias fechado, porque foi o pico e a gente também preferiu fechar e resguardar os funcionários e nós mesmos. Mas em junho, a gente tem um crescimento no faturamento de livros em comparação a meses anteriores, como fevereiro e janeiro. Então a gente acredita que foi uma decisão muito bem tomada".

2020 ainda trouxe mais um desafio ao setor. A proposta de reforma tributária entregue pelo governo Bolsonaro e que está em tramitação na Câmara dos Deputados, prevê uma taxação de 12% na venda de livros. Entidades ligadas ao mercado editorial afirmam que essa taxação pode aumentar o preço dos livros, trazendo desvantagens ao setor e aos leitores.

A Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares, junto à Câmara Brasileira do Livro e ao Sindicato Nacional dos Editores de Livros publicaram um manifesto contra a medida. José Ângelo Xavier, presidente da Abrelivros, avalia a proposta do governo.

"Claro que a proposta do Governo de uma reforma tributária com a taxação dos livros em 12% assustou bastante todo o mercado. Imediatamente as associações vinculadas ao livro se mobilizaram, criamos um manifesto em defesa do livro, esse manifesto começou a ganhar corpo. Hoje já existem iniciativas da própria sociedade de maneira independente se mobilizando em defesa do livro. O livro, historicamente, tem uma isenção de impostos já prevista em Constituição e tem uma alíquota zero de PIS e Cofins desde 2004, por sua função social, para que mais pessoas tenham acesso ao livro. Com uma taxação na ordem de 12%, fica muito difícil para manter acesso ao livro".

Associações e sindicatos do setor de livros, e a sociedade civil começaram campanhas na Internet contra o proposta de taxação apresentada pelo Governo Federal (Imagem: Reprodução/Internet)

Associações e sindicatos de setores ligados aos livros e a sociedade civil começaram campanhas na Internet contra o proposta de taxação apresentada pelo Governo Federal (Imagem: Reprodução/Internet)

Nossa reportagem tentou entrar em contato também com a Câmara Brasileira do Livro e com o Sindicato Nacional dos Editores de Livros, mas, segundo a Assessoria de Imprensa das entidades, não havia representantes disponíveis para falar com nossa equipe. Para o livreiro Guarany Marques, a proposta de taxação dos livros envolve fatores que vão além da economia.

"A taxação dos livros faz parte de um projeto. É o projeto desse governo que pretende acabar com toda a intelectualidade do nosso país. Pretende acabar com todo o pensamento crítico que o nosso povo ainda tem. Então, a dificuldade do acesso à informação, ao conhecimento e aos livros, faz parte do projeto desse governo".

Além dos efeitos da pandemia e da ameaça de taxação, o mercado editorial brasileiro lida com a concorrência de gigantes varejistas mundiais.  José Ângelo Xavier e Guarany Marques relatam que os preços praticados por grandes empresas, além de todo o processo de compra e revenda de livros, colocam editores e livreiros menores em condições de desvantagem.

Reportagem de Gustavo Castello com orientação de Fabrício Girão e Igor Vieira

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