12/01/24

Fortaleza: de destino turístico a primeira nos índices de depressão

Fortaleza é o destino mais procurado por turistas, este ano, mas a capital cearense também é a primeira nos índices de depressão, entre as cidades do Nordeste (Foto: lucasclp/internet)

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Terra da luz e com vista para o Oceano Atlântico, Fortaleza se mantém entre as dez capitais do País e entre as primeiras cidades do Nordeste que mais atraem turistas. De acordo com uma pesquisa do Airbnb, a capital cearense é o destino mais buscado para viagens neste ano, à frente de Salvador e de Gramado.

Além das atrações naturais, Fortaleza tem equipamentos e programação cultural que fazem do pré-carnaval ao réveillon. Fortaleza é festa o ano inteiro, mas não é uma cidade feliz.

Um levantamento do Ministério da Saúde estima que mais de 13% dos habitantes adultos da cidade têm depressão. Dessa maneira, Fortaleza é a capital do Nordeste com mais casos do problema.

Em entrevista à Rádio Universitária FM, o coordenador do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Ceará, Aluísio Lima, reflete sobre as contradições da Cidade:

"Embora Fortaleza seja esse lugar como tantas possibilidades, também é uma cidade que consegue apresentar níveis extremamente extremos de desenvolvimento social. Então, esse abismo separa as pessoas, esse abismo social que ficou ainda maior durante o período que passamos da pandemia, todas essas coisas ficam como um contraste frente a essas ofertas de tantos espaços que poderiam produzir algum tipo de alegria, algum tipo de felicidade."

Fortaleza é marcada por desigualdades profundas: econômicas, de segurança, de felicidades. O professor Aluísio Lima mostra que a cidade e boa parte dos moradores estão separados por um abismo social que mantém a distância até as alegrias:

"As pessoas, muitas vezes, se quer sabem da existência destes espaços culturais. Isso tem a ver com várias coisas, inclusive o quanto determinados espaços culturais, por mais que eles pareçam acessíveis a todos, ainda mantém um tipo de administração, um tipo de forma subjetiva de organização que não é para todas as pessoas. Inclusive, tem que olhar com até mais cuidado esses dados, essa porcentagem, porque ela pode ser muito maior, porque também nem todas as pessoas acessam o serviço de saúde mental porque eles são extremamente lotados, não é uma prioridade."

O especialista considera que as experiências de sofrimento, ou seja, alterações de humor, dores, euforia são parte da condição de ser humano. E orienta como reconhecer quando os sentimentos se tornam transtornos mentais:

"O que vai caracterizar isso como algo que precisa de algum cuidado é a intensidade extrema de algumas dessas sensações, desses afetos e o quanto essa pessoa precisa de alguma maneira do outro para poder lidar com o cotidiano. Então, nesse sentido, a melhor prevenção que a gente poderia ter pra saúde mental seria um olhar pra cidade, um olhar para a população que não fosse restrito ou ficasse focado apenas em números, em uma oferta mínima de psicólogos, psiquiatras, de serviço de saúde mental ou ainda de serviços culturais, espaços culturais, de artes, mas um investimento mais amplo para que as pessoas possam ter acesso a cidade, para que as pessoas possam de fato trabalhar, discutir as questões da desigualdade e que o direito das pessoas possam de fato ser efetivados no cotidiano."

Em uma cidade do tamanho de Fortaleza, retratada como a quarta metrópole nacional pelo último censo do IBGE, o cuidado com a saúde mental cruza os mais distantes caminhos, considera o psicólogo Aluísio Lima:

"Garantir acesso, garantir trabalho, garantir saúde e isso certamente, se bem planejado, possibilita espaços de descanso, espaços de usufruto desses espaços culturais. Sem isso dificilmente as pessoas poderão acessar esses lugares. Ficará apenas acessível aos turistas que podem vir pra cá, que podem pagar para passar as férias aqui."

Na busca por saúde mental, os moradores ainda precisam encontrar Fortaleza, alcançar seus direitos e suas paisagens, conclui o especialista.

"Que elas possam de alguma maneira lutar por esses direitos de acesso à saúde, educação, que elas possam se sentir merecedoras de fato da cidade e que elas possam de alguma maneira procurar por esses espaços. A arte, a própria geografia da cidade, as praias, elas oferecem uma forma de acesso à condições de alegria que podem favorecer muito a saúde mental das pessoas, mas sobretudo um pensamento crítico sobre si, sobre o que está vivendo, pensar como reorganizar essa vida é essencial."

Em Fortaleza, o atendimento público a demandas de saúde mental pode ser feito nos postos de saúde e nos CAPS – Centros de Atenção Psicossocial.

Reportagem de Ana Mary C. Cavalcante

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