16/05/19

Cinco anos de aplicação do Marco Civil da Internet

A ideia do projeto foi adotada em função da resistência social ao projeto de lei de cibercrimes, conhecido como Lei Azeredo, muito criticado sob o pejorativo de "AI-5 digital". (Foto: Jonas Pereira/Agência Senado)

O Marco Civil da Internet comemora, em 2019, 5 anos de aplicação. A lei aprovada pela ex-presidente Dilma Rousseff determina os direitos dos usuários de internet e define regras para as empresas que atuam no mundo digital. Seus principais pontos giram em torno da neutralidade da rede, da liberdade de expressão, da privacidade e do direito de acesso a todos.  

O professor Riverson Rios, pós-doutor em Ciência da Computação pela Universidade de Ottawa, no Canadá, explica como era o uso da rede antes da regulamentação do Marco Civil:

"Havia várias propostas das telefônicas, por exemplo, de rever o serviço da internet baseado no que você está acessando. Seria mais ou menos assim: “Você quer acessar esse site de notícias, eu vou te cobrar por isso, um valor maior porque digamos ela é importante." Quer dizer, iria haver uma cobrança por dados ou por importância deles. O Marco Civil veio e disse: “Não! Há uma neutralidade na rede. Todos os dados são tratados iguais, não importa da onde venha, não importa qual conteúdo.” O que torna, de certa forma, a rede mais aberta, deixa ela mais democrática sem que haja essa pressão para usar um ou outro site, ou que se seja cobrado por um conteúdo. Foi uma grande vitória, eu diria, da sociedade brasileira a formação desse marco. Inclusive, ele está sendo copiado e exportado para outros países."

Criado no segundo mandato do ex-presidente Lula, o Marco Civil da Internet é resultado de um processo que durou 7 anos. No entanto, só virou prioridade após o escândalo de espionagem revelado por um ex-funcionário da Agência Central de Inteligência (CIA), em 2013, no qual mostrou que os Estados Unidos monitoravam brasileiros com ajuda de empresas como Facebook, Google e Microsoft.

Com este episódio, o Governo Federal percebeu a urgência de regulamentar a lei. Por isso, foram realizadas consultas públicas via internet e na Câmara dos Deputados, até a lei ser aprovada pelo Congresso Nacional.

(Foto: Nexo/Reprodução)

O Marco Civil da Internet diz que a privacidade e a proteção de dados do usuário de internet só podem ser violados em investigações criminais. (Foto: Nexo Jornal/Reprodução)

A professora Helena Martins, doutora em Comunicação pela Universidade de Brasília (UnB), estuda políticas de comunicação e direitos humanos e destaca a importância do Marco Civil:

"A primeira questão muito importante é essa ampliação do debate e a percepção de que a internet não é algo só para quem pode pagar por ela, para uma classe privilegiada ou que não interessa a sociedade como um todo. Há nitidamente a afirmação de que a internet é um serviço essencial e que deve ser tratada como tal no Brasil. Se não tivesse a neutralidade de rede garantida, possivelmente o que aconteceria é que esses grandes monopólios digitais estariam definindo as formas de acessar a internet. Além disso, nós temos direitos e deveres, temos toda uma regulamentação sobre formas de remoção de conteúdo. Nesse contexto de fake news que a gente está vivenciando, a gente poderia estar tendo mais conteúdos retirados de forma absolutamente discricionária pelas plataformas e isso não acontece porque temos essa regulamentação."

O documento pode ser considerado uma Constituição do mundo digital, pois estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para internautas e empresas. Porém, pouco dialoga sobre a utilização de dados pessoais dos usuários da rede. Por isso, em agosto do ano passado, foi sancionada a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

Francisco Cruz é diretor da InternetLab, uma associação sem fins lucrativos que realiza pesquisa sobre internet. Ele comenta como a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais completa o Marco Civil da Internet.

"O Marco Civil é uma lei que se aplica para internet, para provedores de internet, para empresas de internet. O mundo da proteção de dados pessoais é muito mais amplo que a internet. Então uma regulação desse tratamento de dados, uma proteção maior da privacidade das pessoas precisa não só de uma lei para internet, mas de uma lei geral que vai atingir todos esses setores de forma abrangente. A ideia é que ela venha entrar em vigor em 2020 e complemente o Marco Civil nessa parte de privacidade. Vamos dizer que o Marco Civil foi um primeiro passo e agora a gente está dando um passo muito mais ambicioso, muito mais importante, abrangente com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais. O Marco Civil foi a primeira vez que talvez a gente começou com a cultura de valorização da privacidade na década recente, mas a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais ela vem pra abraçar muito mais situações que o Marco Civil."

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) o acesso à internet no Brasil teve aumento de 10 milhões de novos usuários entre 2016 e 2017. Além de garantir a privacidade e liberdade de expressão dos usuários, o Marco Civil da Internet foi um passo importante para o uso da rede e serviu também na conscientização de que a internet é um direito de todos.

Reportagem de Thays Maria Salles com orientação de Carolina Areal e Caio Mota.

 

 

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