17/09/20

Amazônia em chamas: os impactos na saúde humana

As crianças, quando inalam a fumaça tóxica, podem apresentar dor e ardência na garganta, tosse, cansaço, dificuldade de respirar, dor de cabeça e outros sintomas (Foto: Secom Gov Amazonas/Reprodução)

Nos últimos anos, o aumento significativo de queimadas na Amazônia vem preocupando especialistas. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), as estimativas para 2020 não são animadoras. Em julho deste ano, foi constatado um aumento de 28% no número de focos de calor, que significam possibilidade de incêndio, em relação ao mesmo período no ano passado.

A fumaça produzida nas queimadas contém poluentes altamente tóxicos para a saúde humana. É o que aponta o relatório produzido pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) em parceria com o Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e a Human Rights Watch. Segundo o estudo, em 2019 foram registradas 2.195 internações hospitalares na região amazônica por doenças respiratórias atribuídas às queimadas.

Valéria Góes é professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC) e orientadora do projeto Liga do Pulmão. Ela explica que a fumaça é rica em monóxido de carbono, substância que compete com oxigênio e reduz a respiração das células:

"Os gases quentes decorrentes da fumaça, quando inalados, podem queimar a mucosa da boca, da garganta, assim como a mucosa de toda via aérea. Os idosos e crianças, ou seja, os extremos da vida, são mais sensíveis a fumaça. A inalação da fumaça pode levar exacerbação, são as chamadas crises de algumas doenças comuns nessas idades, como por exemplo a asma, rinite, bronquite, a doença pulmonar obstrutiva crônica, no caso dos idosos. Também podem piorar ou desencadear alguns outros casos, como doenças cardiovasculares, insuficiência respiratória e a pneumonia, levando algumas complicações. Outra preocupação que se deve ter acerca das crianças é que a exposição a fumaça pode prejudicar o seu desenvolvimento neuromotor, trazendo mais um alerta a saúde."

A avaliação das organizações sobre os impactos na saúde inclui uma análise estatística de dados oficiais sobre internações hospitalares, desmatamento, focos de calor e qualidade do ar (Foto: Human Rights Watch)

A avaliação das organizações sobre os impactos na saúde inclui uma análise estatística de dados oficiais sobre internações hospitalares, desmatamento, focos de calor e qualidade do ar (Foto: Human Rights Watch)

Com a pandemia do novo coronavírus , profissionais da saúde se preocupam com número de internações por intoxicação de fumaça. Além da ameaça de sobrecarga no sistema de saúde, os efeitos da fumaça se tornam uma fator de risco para quem contrai a Covid-19, como explica a professora da Faculdade de Medicina da UFC, Valéria Góes:

“Se o vírus encontra uma a mucosa lesada, seja por uma doença preexistente, seja pelo efeito do tabagismo, pela inalação de fumaça, sua penetração no organismo é facilitada e daí a evolução para doença, ou seja a Covid-19, é um pulo. Potencialmente tanto a Covid-19, quando a lesão decorrente da fumaça, levam a complicações respiratórias e podem agravar quadros pulmonares já existentes. Ou seja, pessoas que possuem asma, rinite, bronquite, doenças ocupacionais respiratórias são bem mais sensíveis a fumaça e podem apresentar vários sintomas respiratórios e também são populações de risco para Covid-19.”

As queimadas na Floresta Amazônica não afetam apenas a saúde humana, mas também é nociva ao ecossistema da região. Os incêndios são provocados em decorrência do desmatamento para a agricultura e para a implantação de garimpos ilegais. Essa é uma prática altera a fertilidade do solo e ameaça a vida de espécies animais, como explica o professor do Departamento de Geografia da UFC, Edson Vicente:

“Nós temos um ambiente natural, uma vegetação com vários animais, fungos, ervas, cipós e a partir do momento em que ocorre uma queimada tudo isso é eliminado. Então você tem uma perda total de um ecossistema e de todas as suas funções, de acumular carbono, de reter água, de manter um clima mais ameno, de manter o regime de chuvas. Então a plena destruição dos ecossistemas e todos as espécies que vivem, plantas e animais. E também os prejuízos que vão ficar como consequência: degradação do solo e a perda de fertilidade do solo.”

A região que apresenta maiores índices de desmatamento, também chamada de arco do desmatamento, decorre, principalmente, do avanço do agronegócio (Foto: Daniel Beltra/Greenpeace)

A região que apresenta maiores índices de desmatamento, também chamada de arco do desmatamento, decorre, principalmente, do avanço do agronegócio (Foto: Daniel Beltra/Greenpeace)

Após iniciados, os incêndios ganham potência e logo se expandem descontroladamente, principalmente nas estações secas. De acordo com o professor Edson Vicente, o extermínio da vegetação e a fumaça produzida das queimadas também pode provocar alterações climáticas e impactar outras regiões do país:

“O Amazonas favorece todo um sistema de um regime de chuvas que necessita estar em equilíbrio com a floresta amazônica. Enquanto a floresta se mantém, esses rios vão alimentar os aquíferos, os rios de outras regiões. Então, a partir do momento que essa vegetação vai sendo eliminada, esse sistema vai se alterando e o que a gente está observando é uma diminuição significativa de chuvas em outras regiões.”

Em julho de 2020, o Governo Federal sancionou o decreto que proíbe as queimadas em todo o território brasileiro, em especial nas áreas da Amazônia Legal e do Pantanal, durante 120 dias. No entanto, de acordo com o Inpe, o Amazonas fechou o mês de agosto com 8.030 mil focos de queimadas ativos. Esse é o maior número já registrado em um único mês desde 1998. De acordo com a organização Human Rights Watch, ainda que o decreto esteja em vigor, essa determinação se mostra ineficaz sem as devidas medidas de fiscalização ambiental.

Reportagem de Lara Vieira com orientação de Carolina Areal, Fabrício Girão e Igor Vieira.

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