15/04/19

Os impactos sociais e ambientais do uso de agrotóxicos

No dia 10 de abril de 2019, o Ministério da Agricultura permitiu a utilização de mais de 30 novos tipos de agrotóxicos. Em 100 dias de governo, mais de 150 substâncias já foram liberadas (Foto: Divulgação/Seab-Paraná)

O uso de agrotóxicos no Brasil voltou a ser discutido nos últimos meses. Desde janeiro, 86 novos tipos de agrotóxicos e derivados foram liberados no Brasil. Alguns desses produtos chegaram a ser banidos em países da União Europeia e nos Estados Unidos, devido ao seu alto grau de toxicidade e contaminação.

De acordo com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), entre 2017 e 2018, o Brasil utilizou cerca de 500 mil toneladas de agrotóxicos. Esse processo gerou uma movimentação de mais de 33 bilhões de reais e colocou o país entre os maiores consumidores de agrotóxicos no mundo.

Mas afinal, existe uma preocupação por parte da sociedade com os impactos que esses produtos causam na saúde e no meio ambiente? Ada Pontes, professora da Universidade Federal do Cariri (UFCA), explica os impactos que o uso desses insumos causa na saúde humana:

"É importante a gente enfatizar que esses produtos causam tanto problemas agudos, com sintomas que podem se manifestar de 24 até 72 horas - e quais são esses sintomas? Náuseas, vômito, dor de cabeça, dor abdominal, tontura - como também a exposição pode causar efeitos crônicos, a longo prazo. E quais são esses problemas? Câncer, más formações congênitas, diabetes, doenças neurológicas".

A Abrasco revelou em seu Dossiê sobre agrotóxicos, de 2015, que o brasileiro consome, por meio dos alimentos, 7,3 litros de pesticidas por ano (Infográfico: Mariane Arantes)

A Abrasco revelou em seu Dossiê sobre agrotóxicos, de 2015, que o brasileiro consome, por meio dos alimentos, 7,3 litros de pesticidas por ano (Infográfico: Mariane Arantes)

A fauna e flora terrestres e também os oceanos sofrem com a ação dos agrotóxicos. No começo de 2019, apicultores relataram prejuízos com a morte de mais de um milhão de abelhas na Região Sul do país. Segundo investigações, a causa das mortes das abelhas estaria associada ao envenenamento pela utilização de agrotóxicos em áreas próximas.

Além disso, chama atenção um dado da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), de que 70% dos alimentos naturais consumidos no país estão contaminados por agrotóxicos. Soraya Vanini Tupinambá, presidente do Instituto Terramar, comenta sobre a ação dessas substâncias no meio ambiente e no cultivo de alimentos.

"Existem duas implicações de impactos do uso de agrotóxicos. Uma é o comprometimento da qualidade ambiental, a contaminação de recursos hídricos de lagos, lagoas, rios, águas superficiais, lençóis freáticos de solo, de ar. E existe o prejuízo à saúde humana pela contaminação atmosférica, pela contaminação dessas águas que são utilizadas para consumo humano. Então tudo isso faz com que seja prejudicial".

No âmbito político, os projetos de lei mais recentes parecem caminhar para uma flexibilização maior da comercialização desses insumos. Uma dessas medidas é o Projeto de Lei 6.299, criado em 2002, e que ficou conhecido como a Lei do Veneno.

A proposta visa mudanças como a alteração do termo agrotóxicos para produtos fitossanitários e a fiscalização desses produtos apenas pelo Ministério da Agricultura. Renato Roseno, deputado estadual pelo PSOL no Ceará, faz um panorama do debate político a respeito dessas substâncias:

"É evidente que o setor produtivo tem muito poder político econômico. A chamada bancada ruralista nomeou a principal defensora da liberação dos agrotóxicos como ministra. Então agora existe um pacote em tramitação, que é um pacote de liberação. Só nesses primeiros três meses já foram liberados mais de 120 novos produtos de agrotóxicos. Então essa bancada tem muito poder político e econômico e eles querem liberação, desregulamentação. Eles não querem pesquisa, não querem informação sobre isso".

No início de 2019, foi colocada em vigor a lei que proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos no Estado Ceará. O projeto tem a autoria do deputado Estadual Renato Roseno (PSOL-CE) (Foto: Agência Brasil)

No início de 2019, foi colocada em vigor a lei que proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos no Estado do Ceará. O projeto tem a autoria do deputado estadual Renato Roseno (PSOL-CE) (Foto: Agência Brasil)

Mas o que pode ser feito para mudar o rumo dos interesses do agronegócio? A professora Ada Pontes cita algumas ações que estão sendo tomadas para alertar sobre a expansão dos agrotóxicos:

"Está previsto para ser votado agora no mês de maio a proposta da Pnara, Política Nacional de Redução de Agrotóxicos, que prevê um incentivo orçamentário financeiro para os agricultores familiares que estão em processo de transição agroecológica. Além disso, a gente tem uma campanha, que está fazendo oito anos, que é a Campanha Nacional Contra os Agrotóxicos e Pela Vida. É uma campanha que reúne movimentos sociais, universidades, instituições públicas e tem reunido estudos e evidências que comprovam os danos à saúde causados pelos agrotóxicos".

O deputado Renato Roseno complementa e propõe ações a fim de oferecer um modelo mais sustentável de produção:

"Primeiro é acabar com a isenção. É um absurdo hoje o Estado do Ceará dar isenção total de Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) aos agrotóxicos. Segundo, nós temos que banir os banidos. Já existem pelo menos 17 princípios ativos que já foram banidos na União Europeia e tem que se perguntar por que é que eles foram banidos lá? Há uma evidente correlação entre câncer e esses princípios ativos. Uma terceira questão é incentivar outra forma de produção agrícola que seja ecológica, que produza alimentos saudáveis. A gente sabe que isso é socialmente viável, é mais justo, é economicamente sustentável, é ambientalmente melhor e é muito melhor para a saúde pública".

Esses mecanismos são importantes para buscar formas de produção agrícola menos prejudiciais ao meio ambiente e ao consumidor final.

Reportagem de Pedro Silva com orientação de Thaís Aragão e Igor Vieira.

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