08/10/20

Os 70 anos da televisão no Brasil

Após um discurso de Assis Chateaubriand, entrava no ar a primeira emissora de televisão do Brasil: a TV Tupi (Foto: TV Tupi/Reprodução)

Foi num cenário de aventura e muito improviso que a televisão brasileira nasceu. No dia 18 de setembro de 1950, São Paulo se tornou palco da fundação oficial da primeira emissora de televisão da América Latina e a quarta do mundo. A TV Tupi foi uma ideia ambiciosa que veio do jornalista paraibano Assis Chateaubriand.

Poucas horas antes da estreia, uma das três únicas câmeras existentes no Brasil quebrou. Mas isso não foi um impedimento. Após a benção do bispo da cidade, a rede Tupi entrou no ar com o programa de variedades TV na Taba. Conduzido pelo apresentador Homero Silva, o programa também teve participação de Rosalina Coelho Lisboa, Lima Duarte, Lia de Aguiar, Lolita Rodrigues e Hebe Camargo.

Por conta da inexperiência e da falta de recursos, a TV utilizou, em seus primeiros momentos, estruturas e formatos de programação do rádio. De acordo com o professor do Departamento de Ciências da Informação da Universidade Federal do Ceará (UFC),  Márcio Assumpção, que estuda a relação entre memória e televisão, não haviam profissionais especializados nessa mídia e os artistas eram principalmente do rádio e do teatro.

"A influência do rádio na formação da televisão brasileira: é de onde vinham as vozes, de onde vinham as interpretações sem imagem. É de onde vinham as locuções. Então você tem uma miscigenação, uma mistura, quando você coloca a televisão que gera uma necessidade de aprendizados vários, que você não tinha ainda. Então você acaba caindo, não numa armadilha, mas numa surpresa, que é a questão do aumento da necessidade de criatividade e de improviso devido, justamente, a essa precariedade dos meios na época".

 

Imagem de divulgação de 2-5499 Ocupado, a primeira telenovela diária do Brasil (Divulgação/Internet)

Imagem de divulgação de 2-5499 Ocupado, a primeira telenovela diária do Brasil (Divulgação/Internet)

Entre as décadas de 1960 e 1970, a TV passou a ser mais acessível financeiramente a uma maior parcela da sociedade. Além da implantação da televisão a cores, nessa época também surgiram as primeiras telenovelas, como a pioneira Sua Vida me Pertence. Tudo era feito ao vivo e os capítulos exibidos às terças e quintas-feiras. A primeira novela diária foi 2-5499 Ocupado, de 1963. A rotina de exibir as novelas todos os dias, no mesmo horário, ajudou a segurar o público. Para o professor da UFC, Márcio Assumpção, outro fator para o sucesso das telenovelas é a forma com a qual retrata os costumes e a cultura do brasileiro.

"Existe um fator muito pesado da telenovela brasileira que é a questão da identidade com a população. O que a gente vê nas telenovelas, é claro que é de uma maneira trabalhada, existe um roteiro, existe uma história, mas o que a gente vê na telenovela geralmente é aquilo que se passa dentro das nossas casas. Essa preocupação sempre existiu. A telenovela sempre foi um retrato do cotidiano. Cotidiano presente ou passado? Isso aí na verdade pouco importa. Mas as novelas sempre tenderam a ter uma motivação temática condizente com a realidade da época".

Na área de telejornalismo, o programa Repórter Esso, exibido pela TV Tupi, de 1952 a 1970, foi quem estabeleceu o que passou a ser considerada a linguagem do telejornal. É o que comenta a professora Kamila Bossato, coordenadora do curso de Jornalismo da UFC:

“Com aquele formato de bancada, do apresentador que lê as chamadas e chama para a matéria, pro VT. Lógico que não tinha tantos VTs como hoje em dia, muita coisa era só lida mesmo, a nota pelo apresentador. Mas o que foi depois, o Jornal Nacional mesmo, com Cid Moreira o Sérgio Chapelin. Eles replicaram em grande medida o que se estabeleceu no Repórter Esso. Então ele estabeleceu ali o início de uma tradição, digamos assim. Que depois, lógico, foi mudando com a própria tecnologia. Você ter acesso mais facilitado ao vídeo, ao VT, fez com que passasse a ter muito mais matérias, presença do repórter na câmera. Tudo isso começou lá no Repórter Esso e foi, lógico, transformando lentamente com o desenvolvimento tecnológico”.

Através da internet, o streaming representa uma nova forma de assistir televisão (Foto: Istoé)

Através da internet, o streaming representa uma nova forma de assistir televisão (Foto: Istoé)

Com a expansão da internet e a chegada do mercado de streaming no Brasil, a televisão brasileira passa por um momento de reinvenção. De acordo com o IBGE, o acesso da Internet através da televisão subiu de 16,1%, em 2017, para 23,3%, em 2018. De acordo com a professora da UFC, Kamila Bossato, o uso da Internet não representa a ameaça de um fim para a televisão, mas uma nova forma de consumo.

“Se a gente pensar no modelo da televisão tradicional, com uma programação fixa em que a pessoa simplesmente liga a TV e recebe aquilo passivamente, isso de fato vai acabar. Cada vez mais as pessoas vão querer ter liberdade para definir que horas assistir, como assistir, quando assistir. Montando sua própria programação. Mas, por outro lado, a gente tem um crescimento absurdo de outras formas de ver televisão. Seja pelo YouTube, os canais de streaming como Netflix, e que tem aumentado, ampliado, são várias possibilidades, até a Globo entrou nisso. Então, você tem outras formas de ver televisão e o que tá fazendo com que a televisão se torne mais forte do que nunca. Mais valorizada do que nunca”.

Reportagem de Lara Vieira com orientação de Fabrício Girão e Igor Vieira.

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