11/06/18

Proposta de educação integral em Fortaleza

Estudantes da Escola Estadual de Ensino Profissional Jaime Alencar de Oliveira, no bairro Luciano Cavalcante. No Ceará, uma em cada três escolas funciona em tempo integral (Foto: Thiago Gadelha/Diário do Nordeste)

A educação integral está relacionada ao desenvolvimento dos cidadãos em todas as suas dimensões, sejam intelectuais, físicas ou culturais. Ela representa a opção por um projeto educativo que integra as necessidades, interesses e possibilidades de todos, além de garantir os seus direitos em todas as esferas.

Um dos eixos da educação integral é a escola em tempo integral, ferramenta que aumenta a jornada escolar dos estudantes. De forma geral, essa ampliação de carga horária pode acontecer de duas formas dentro das instituições de ensino.

Algumas escolas optam pelo acréscimo ou pelo aumento de horas das disciplinas existentes na grade curricular dos alunos. Outros centros preferem à adoção de atividades que vão além das disciplinas obrigatórias ofertadas, em geral, ligadas a práticas artísticas, esportivas e tecnológicas.

Laísse Mariano é diretora da Escola Estadual de Ensino Profissional Dona Creusa do Carmo Rocha, localizada no bairro Monte Castelo. Ela apresenta os principais benefícios que o ensino integral traz aos estudantes:

"O principal ponto positivo é porque a educação em tempo integral viabiliza uma formação completa. Além de conteúdo, a gente prepara o jovem para que a formação acadêmica e profissional dele contribua para que ele possa mudar a realidade da comunidade em que ele vive. Além disso, ela propicia a educação pelo exemplo. O jovem passa o dia na escola e convive com os seus amigos e com os seus educadores".

Além dos incentivos proporcionados aos alunos, entende-se que as escolas em tempo integral representam uma parceria com a comunidade. As correntes que defendem essa forma de ensino garantem que o aumento da jornada escolar gera o desenvolvimento de crianças e adolescentes.

Laísse Mariano relata como é a receptividade dos alunos na instituição de ensino em que trabalha, em relação ao sistema de educação em tempo integral:

"Tanto o aluno quanto a comunidade e a família, a gente observa uma grande aceitação. Primeiro, porque a família vê na escola uma parceira e a escola vê na família também essa parceria. O aluno entra em contato com novas possibilidades. Além disso, no caso das escolas profissionais, existe ainda a possibilidade de que o aluno, além de sair preparado para dar segmento aos estudos e, seguinte, dentro de uma vida acadêmica, ele já sai preparado para o mundo do trabalho, para exercer uma profissão . Tanto para ele quanto para a família é gratificante. Então a gente observa essa aceitabilidade".

Alunos de Escola Profissionalizante realizam atividade em laboratório. De acordo com a Seduc, existem 119 escolas de ensino profissional no Ceará (Foto: Reprodução/SEE-Ceará)

Alunos de Escola Profissionalizante realizam atividade em laboratório. De acordo com a Secretaria de Educação do Ceará, existem 119 escolas de ensino profissional no Estado (Foto: Reprodução/SEE-Ceará)

Entretanto, as escolas de ensino em tempo integral não são vistas somente no aspecto positivo por todos os seus participantes. Alguns movimentos ligados à educação entendem que a ampliação do tempo de estudo não proporciona uma melhoria na qualidade de ensino e de formação.

Idevaldo Bodião, professor aposentado da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará (UFC), questiona o aumento da jornada escolar no sistema de educação integral:

"Não se trata simplesmente de expandir o tempo na escola. É preciso uma proposta pedagógica que incorpore a vantagem de mais tempo na escola usando de forma diferente os espaços da escola e os espaços culturais da cidade. Temos uma escolarização muito fechada dentro da escola, muito fechada dentro das paredes da sala de aula. Nós não vamos pra museus, nós não vamos para atividades fora. É verdade que temos muito pouco, mas esta seria uma possibilidade".

Entre os estudantes, também há o entendimento de que a proposta integralizante apresenta algumas dificuldades. Na Escola de Ensino Médio em Tempo Integral Telina Barbosa da Costa, localizada em Messejana, alguns alunos relatam problemas na estrutura dessa forma de ensino.

A falta de estímulos à participação nas denominadas disciplinas eletivas é um dos fatores que reiteram as complicações do ensino em tempo integral. Rebeca Soares, estudante do segundo ano, comenta sobre as contradições da proposta dentro de sua instituição:

"A questão de passar o dia todo aqui é muito complicada, porque a gente, vamos dizer, perde o tempo do nosso dia, podendo estar fazendo cursinho; ou tem gente que gosta de trabalhar, e quer trabalhar e tal. E tem algumas eletivas, que a maioria das vezes é na tarde, que não têm muito sentido e são mais para preencher o tempo"

Estudantes do Liceu do Conjunto Ceará participam de disciplina eletiva de Comunicação Foto: Instagram/Robson Braga)

Estudantes do Liceu, localizado no Conjunto Ceará, participam de disciplina eletiva de Comunicação (Foto: Instagram/Robson Braga)

Além das complicações, alguns estudantes acreditam que as disciplinas eletivas deveriam ter um foco maior para outras atividades, em geral, relacionadas ao ensino superior e ao mercado de trabalho. Harrison Torquato, estudante do segundo ano e colega de Rebeca Soares, sugere algumas ideias que poderiam ser aplicadas na jornada escolar do centro de ensino:

"As eletivas deviam ser relacionadas ao tema Enem. Ou preparação para vida mesmo, como fazer um currículo, trabalhos, para a galera sair do colégio, assim, pronto. Porque tem gente que sai do colégio e 'e aí, o que eu faço agora?', porque não tem nenhuma preparação dentro do colégio."

Procurada pela reportagem, a assessoria de comunicação da Secretaria de Educação do Ceará (Seduc), emitiu uma nota institucional reiterando alguns pontos positivos do ensino em tempo integral no estado.

Segundo a Seduc, ao todo, existem duzentas e trinta escolas em tempo integral, divididas em ensino médio e cursos técnicos. Essas instituições atendem cerca de 76 mil alunos em diversos municípios cearenses e estão presentes em áreas que são consideradas mais vulneráveis.

Sobre as críticas relatadas pelo professor Idevaldo Bodião e pelos estudantes Rebeca Soares e Harrison Torquato, sobre o modelo de educação integral, a Seduc não se posicionou sobre o assunto.

Reportagem de Pedro Silva com orientação de Carolina Areal.

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